sábado, 4 de março de 2017

Um jovem como Telêmaco


Telêmaco partiu em busca do pai. Ulisses, o grande rei de Ítaca, saíra de casa há 20 anos para combater em Tróia. Ninguém em sua terra natal sabia de seu paradeiro ou morte. Penélope esperava angustiada o marido. Telêmaco via a mãe sendo assediada por muitos homens, e os bens de sua família sendo dilapidados por eles. Guiado por Atena, na figura de Mentor, Ulisses foi a alto mar.

Ao chegar em Pilos, Telêmaco hesita sobre o que deveria fazer. Atena diz para ele não ter vergonha, pois é justo o propósito dele, e foi com o nobre objetivo de saber o destino do próprio pai que ele atravessou o mar. Ele falará com Nestor, ancião que vira muitas gerações de guerreiros, e ao lado de Ulisses combatera em Tróia. Telêmaco pergunta a Mentor sobre como deverá cumprimentar Nestor. O rapaz afirma não possuir experiência com palavras sutis, “e que é natural que um jovem se iniba de interrogar um homem idoso”.

O filho do grande e famoso Ulisses era ainda sem importantes feitos e sem fama. Ele teria suas próprias aventuras, onde mostrará as qualidades herdadas do pai. Telêmaco sabe bem da sua estatura atual, e não supõe saber sobre o que lhe é novo. Como portar-se diante do experimentado guerreiro e conselheiro Nestor? Na conversa com o ancião, Telêmaco se apresentará cuidadoso, educado e atento. Telêmaco tem berço. É impossível não ver nele reflexos de um jovem Ulisses.

Em nossos dias, vemos jovens que parecem acreditar já saberem de tudo, pois apresentam-se sem cuidado e apressadamente. A forma como se comportam na rua é a mesma com que se comportam em casa, que é a mesma com que se comportam na escola e em todos os lugares. “Tá tranquilo”, dizem, sem considerar os saberes e os comportamentos necessários para lidar com cada pessoa e lugar. Acham que com o seu “jeitinho”, conseguirão tudo: empregos, mulheres, posições sociais, etc.

Atena diz a Telêmaco: “algumas coisas serás tu a pensar na tua mente; outras coisas um deus lá porá: na verdade não julgo que foi à revelia dos deuses que nasceste e foste criado.” (Odisseia. Canto III, verso 25). Telêmaco possui atributos vindos dos deuses. Ou vindos de um grande pai, o que dá no mesmo. Simultaneamente, esses atributos são dele mesmo. Aqui não há a necessidade de distinguir os atributos próprios daqueles que “vieram de outras pessoas”. Telêmaco não é como eu e você, que anseia por ser individual.

Entretanto, quando, por exemplo, no esporte, assistimos a um desempenho excelente, sentimo-nos presenciando algo além de uma capacidade humana. Vemos um talento inexplicável. Por isso dizemos que quem tem talento, ou quem trabalha muito, é ajudado pelos deuses, ou tem sorte. Diferentemente da pessoa que já acredita saber de tudo: ela não é ajudada pelos deuses. Ela move-se depressa demais, e os seres divinos não conseguem alcançá-la. Você já deve ter visto um anjo da guarda chegando atrasado para evitar uma catástrofe, com o seu protegido. É isso.

A comitiva de Telêmaco é bem recebida por Nestor e seus homens. Telêmaco diz a Nestor que apresenta-se como suplicante, por qualquer notícia sobre o paradeiro de seu pai. No início de sua fala, disse de quem era filho. Mas logo mostrou não querer chegar rápido demais à posição deste. Por isso, ajoelhou-se. Nestor conta ao jovem sobre os mortos em Tróia, os melhores guerreiros: Ájax Telamônio, Aquiles, Pátroclo, e também o seu próprio filho. Acompanhado de Ulisses, ele próprio saiu de Troóia, após vencerem a guerra. Mas eles se dividiram em naus distintas, e estas tomaram rumos diferentes. Nestor chegou em sua casa. E de Ulisses, infelizmente, ele não possuía mais notícias.

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