terça-feira, 14 de março de 2017

Juventude contemporânea


Na sala de aula, a jovem observa ao professor: "Contemporâneo é uma palavra que me parece vazia. Todos dizem isso. Eu acho que é balela." O professor, após anos, talvez décadas de estudo, fala que o contemporâneo é uma ideia do presente. A jovem, por sua vez, está fora do presente, e também está dentro do presente, como Agambem, em "O que é o contemporâneo", leva a dizer.

Contemporâneo é aquele que odeia o seu tempo mas não arreda o pé dele. A academia usa a palavra "contemporâneo" em todos os seus textos, sem conceituá-la, ou seja, sem dar a ela um caráter universal, e por isso mesmo discutível (a má formulação é indiscutível). Esta palavra, então, acaba não saindo do senso comum, e não servido em nada para observá-lo. A pergunta da jovem mostra esse furo dos teóricos, esse desconhecimento que eles não percebem que têm.

A jovem mostra que formulações imprecisas não a satisfazem, não respondem às suas urgências. Estas urgências são sempre presentes, e delas a jovem lembra enquanto escuta do professor teorias contemporâneas. Ela percebe, ainda seguindo com Agamben, a escuridão que acompanha as luzes do presente. A jovem é de fato contemporânea porque está no presente e o mesmo tempo consegue olhar para ele. A vida do dia a dia é a motivação original de todas as teorias: a pergunta feita em sala traz essas questões não resolvidas, e que a todo momento se insinuam, inconvenientes.

Enquanto alguns se regozijam por suas teorias, que apontam para diferentes direções, aquele que está insatisfeito, que procura uma formulação que o ajude a convencer o seu pai obtuso (e se não o faz, ele próprio não se convence verdadeiramente, pois os problemas da vida não se separam dos resmungos do pai), quer um fio para atar as antigas urgências e aquilo que se põe como o presente. A jovem marca uma ruptura com o professor, ao mostrar que a prática da teoria não a atende, e que talvez não atenda mais ninguém verdadeiramente. Mas ela permanece escutando as aulas, quer se formar, só não esquece o que a levou ali. Da mesma forma como ela separou um passado insistente de um presente que não se enxerga, ela pode dizer algo diferente do que andamos pensando.

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