quarta-feira, 18 de maio de 2016

Um momento em um destino



A guerra odiosa dura para sempre. Consome vidas, tempos de vidas (lifetimes). No livro Ilíada, de Homero, os deuses decidem quem vencerá, protegem um homem, um exército ou uma cidade.

Os homens são folhas: surgem fortes e rijos, morrem com sua rigidez mostrando-se quebradiça. Cada homem sabe que morrerá. Sorte daquele que possuir um belo destino a cumprir. Os deuses favorecem o guerreiro destinado a grandes feitos. Seu corpo, ao morrer, é pranteado pelos outros mortais. Deuses e homens lembrar-se-ão dele, que tornou-se imortal em sua glória.

No filme Tróia (Petersen, 2004), Aquiles decepa a cabeça da estátua de Apolo, na entrada do templo deste deus. O rei troiano, Príamo, é devoto deste deus. A troiana Briseida, que está sob o poder de Aquiles, é devota de deuses. Os deuses têm inveja dos homens, disse Aquiles para ela: em uma eternidade de guerras, o momento de um homem não se repetirá. Este momento pode ser gerador de glória, encaminhando o homem para a eternidade. Este momento pode ser, por outro lado, válido por ele mesmo. A noite de amor entre Aquiles e Briseida é válida porque passageira.

No fim do filme, os troianos acreditaram que o grande cavalo negro de madeira era um presente dos gregos ao templo de Poseidon, mantido por eles. Os crentes levaram o grande cavalo para o interior do seu espaço protegido. Rindo deste deus e dos crentes, os gregos aproveitaram a noite para saírem do cavalo e destruírem Tróia de belas muralhas.

Menelau, Patroclo, Heitor e Aquiles, mortos importantes, amados ou gloriosos, passaram pelo ritual de entrega de seus corpos a Hades. O ritual que marca o encerramento da vida é prática comum, no filme. Os rituais aos demais deuses, responsáveis pelos outros aspectos da vida dos homens, não são, contudo, uma unanimidade. A mortalidade manteve um cuidado especial. A vida continua na glória. Por outro lado, a vida se encerra a cada belo momento vivido.

O corpo de Heitor está degradado, no filme. Aquiles o arrastou atrás de sua biga. O leão destroçou um homem. No livro, os deuses reprovam esta selvageria de Aquiles, e protegem o corpo de Heitor. Ele é amado pelos deuses, assim como Aquiles. Heitor vai íntegro para o Hades e a glória eternizadora.

No filme, ele vai esfacelado para estes lugares. Algo foi perdido, algo passou no filme. O rosto de Heitor era bonito durante a sua luta com Aquiles. Um retrato deste rosto o eterniza. Morrer pela espada de Aquiles era o seu destino. Esta morte, contudo, ocorre num segundo, e momentos são coisas que os deuses desconhecem.

Um momento no interior de um destino é um retrato de homem na parede de uma cidade divina.

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