sábado, 20 de fevereiro de 2016

Negócios com o ex



Eles se separaram. O negócio que abriram juntos continuou. Ela espreme pedras e sai clientes. Diariamente ele assenta e dirige a equipe em direção ao sucesso. Jamais um abrirá mão do outro. Só que eles não mais dividem os lençóis, as risadas e a frustração pela incomunicabilidade entre almas.

Agostinho tributou à falta da linguagem verbal dele próprio, quando criança pequena, a impossibilidade de comunicar uma necessidade interna a alguém, externo a ele. Mas o consórcio dos adultos tampouco foi auspicioso, para o bispo de Hipona: a amizade levou-o a roubar, uma ação empreendida para afastar a vergonha, que sente um jovem diante dos amigos, de ter vergonha em roubar. De que adiantava a comunicação com os outros, se ele não se comunicava com Deus, aquele que faria a vida dele não ser uma morte? O faria amar algo além do transitório e pequeno si mesmo?

Queremos um marido para parceiro de almas e das coisas da vida. Entendemos que é fundamental a troca corporal, para a parceria das almas. Manuel Bandeira disse que as almas não se entendem, e sim os corpos. Para um filósofo platônico, o sexo desregrado entorpece as almas. O amante não pode exaurir-se com a pessoa amada. Deve tomar a distância do olhar, para receber sua divina enxurrada de beleza e a alma dele, então, criar asas. A amizade, em Platão, é a situação de mútuo desenvolvimento. Um desenvolve a alma do outro ao se importar com o que o amigo diz, com a forma com que ele conduz a sua vida, e ao querer mostrar melhorias nas coisas que ele mesmo diz ao amigo e faz diante dele. Esse desenvolvimento também aponta para a divinização das almas envolvidas.

Ao levantarem da cama, os amantes descobrem uma distância. Entendem-se como podem, pois gostariam de garantir o reencontro de corpos, na próxima noite. Por estarem se frustrando além do suportável, no jogo amoroso do dar-administrar a falta, param com aquilo. Separam-se. Mas ocorre de eles entenderem-se bem demais fora da cama, e fora da expectativa das almas. A atitude de um combina com a do outro, e o negócio se desenvolve. Segunda-feira se reencontram "como amigos", no escritório, e é animador.

Freud contou que a libido sexual reprimida voltava-se a objetivos culturais. Mas negócios excitam. Homens arrojados são excitadíssimos e excitantes. Eles assim o são enquanto são homens arrojados. Em casa eles não funcionam. O negócio virou o tesão deles.

Eventualmente o ex-casal faz sexo no escritório. Isso tem nada a ver com o sexo que eles fazem com seus novos namorados. Este segue aquela lógica neurótica da busca por satisfazer um pouco a necessidade, parecendo que se a está satisfazendo muito, por causa da promessa, que paira no ar, de um grande gozo vindouro. O homem e a mulher arrojados, por sua vez, estão gozando já a sua grande parceria, e o gozo do desenvolvimento do negócio será fortíssimo, mas tão bom quanto o de hoje. Às vezes não precisa ocorrer sexo: o gosto do sucesso parece melhor do que tudo.

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