sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Em 2016, seja o melhor!


Todos sentaram-se para ouvir Aretha (http://www.publico.pt/…/quando-aretha-comecou-a-cantar-ate-…). O presidente do maior país, o diretor do maior filme, outra pessoa, mais muitíssimas outras, ficaram atentos para o que viria da melhor cantora. O que viria dela? A maior cantora do mundo, com mais de 70 anos de idade. Uma potência abaixo do que um dia já foi? Essa pergunta não existe. É uma cantora com a sua voz inteira, a sua presença inteira. Subiu ao palco, e não se economizou.

Um deus estava com ela, leríamos em Homero, sendo dito por um espectador/alguém que estava lá para ser o corpo a receber suas vibrações, na luta. O espectador é combatente, a Aretha canta e ele vibra. Entre nós, não evocamos um deus, diretamente, para explicar a magnificência de alguém. Evocamos a história, mas não do indivíduo, e sim dos momentos em que o escutamos e nos formamos um corpo a recebê-lo, e ele se formou um mestre de sua arte.
Se houvéssemos acabado de ouvir falar em Aretha, sentiríamos algo completamente diferente do que sentimos, tendo participado dessa história. A dificuldade de contar uma experiência é que a contamos do ponto de vista do indivíduo, quando ela requer vivência da relação. Desde pequeno ouço dizer que ela é a melhor cantora do mundo. Isso tem um efeito.

Obama e George Lucas estavam atentos a Aretha. Os melhores. Mas, ao ouvirem a melhor, somaram-se aos milhões que sempre se puseram atentos a ela, para serem a pele que recebe o canto, e a pele que demanda o canto. Essa é a batalha que travamos com Aretha, como há em Homero, apesar de estarmos sentados.

O melhor da nossa atenção incita o melhor de Aretha. Gostamos do seu impacto, gostamos da performance excelente. Ela é capaz de nos tocar, quando estamos insensíveis. Separamos momentos para sermos tocados, para fazermos essa luta. Um italiano assiste um tenor. O brasileiro assiste o futebol. Perdem as estribeiras. São vistos como doidos por quem é de fora. Mas aquele momento foi reservado para eles lutarem. Um torcedor gasta tanta energia (ou mais!) do que um jogador. Lá eles são tocados, e mais: eles tocam, batem de volta.

Sentados ao lado dos melhores, naquele momento somos como eles, temos a mesma sensibilidade e capacidade de incitar o artista. Por tudo o que eu sinto, sou o melhor ouvinte de Aretha. Como negar, isto?
Os melhores sentam ao nosso lado para receber algo melhor do que eles. Obama sentaria para escutar um grande professor, embora fosse um aluno perguntador. Seria a melhor aula para o melhor aluno. A América aprende com os melhores do mundo.

Considero-me o melhor nas coisas que faço. Admiro os melhores do que eu. Como é possível haver dois melhores? É possível, se eles se colocam um diante do outro, batalhando e se admirando.
Na Ilíada, Heitor é o que mais admirava Aquiles. O odiava, queria matá-lo. Mais do que isso: queria vencê-lo, ter a chance de ser melhor do que ele. A luta é a única situação em que pode haver dois melhores.

Quem consideramos os melhores, entre nós? Poucos nomes restam. Temos talento em diminuir quem é bom. E em nos corromper, quando somos bons.

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