segunda-feira, 15 de junho de 2015

O empolado e o minimalista

Você vai comer um cachorro-quente gourmet. No cardápio, até o nome dele foi gourmetizado. Tem alguns lanches gourmet que você acaba de comer e, se for sincero, diria que é o mesmo cachorro que sempre comeu, talvez com linguiça até ficasse melhor.
Em uma palestra, ou entrevista na tv, o especialista usa linguagem rebuscada. Ou exibe elementos recolhidos nos quatro cantos do mundo, e semi-exclusivos. Nem sempre a exposição é realmente original ou boa. E não é surpreendente que você considere o crochê que sua vizinha faz bem mais bonito do que aquele treco indiano que foi mostrado.
Volta e meia eu mesmo uso de mais empolação do que tem valor o meu conteúdo. Mas aqui eu falo dos que exageram na empolação, e entregam de fato muito pouco.
A empolação facilmente entra no lugar do feijão com arroz bem feito, do estudo paciente e aprofundado. Muitas vezes ela não te prepara a comida que te alimentou antes de você ir para a escola, e te fez crescer, não te dá a análise que acrescenta algo novo, ou inspira mudanças boas. Mostra a mesma coisa, com aparência de novidade.
Já que vendemos imagem, acaba ocorrendo de se produzir algo que veicula uma imagem de que o produtor é qualificado, acrescida da imagem da produção, completada com a imagem para a venda, como uma sucessão de fotografias montadas, que escondem preparação, produção e apresentação pobres ou velhas.
Você é diferente do empolado, e vai comer um podrão na esquina. No churrasco, elogia a trilha do Molejo. Você é universitário, mas não gosta que lhe digam explicações longas. Odeia o manual do seu trabalho: ninguém o segue, não se recompensa o certinho. Você é minimalista, odeia quem aparece. Quer ser visto no Leblon, comendo pão-na-chapa, mas "quase sem querer". No restaurante, não dispensa o cafezinho, vai no simples e no tradicional, para não parecer com o empolado.
Para que serve estudar muito, fazer algo com mestria, ou ser uma boa pessoa? Estas coisas não fazem diferença, para se obter dinheiro e amor. O que faz diferença é a imagem destas coisas, mesmo que seja imagem vazia. Ou melhor: a imagem precisa ser vazia! Você quer um namorado inteligente, mas que não passe uma noite ou outra estudando.
Como ser realmente bom em algo foi trocado pela mera imagem do ser bom em algo, essa caracteristica perde o sentido. O personagem-empolado serve para o palco. O verdadeiro especialista, quando fala diretamente com você, é visto como chato, arrastado ou detalhista demais.
O minimalista finge não gostar de aparecer, pois quer se diferenciar do especialista que ninguém gosta, e não ser confundido com o empolado que adora o palco. É a mulher que se enfeia. Ela faz o jantar e fala que cozinhou mal. Mas ninguém pode dizer que não gostou, pois esse show é só dela.
Tem, também, o minimalista estilo popular: ele faz da própria imagem o chinelo de dedo e o mocotó no boteco, mesmo que tenha dinheiro. Quer ser retratado em matéria de um grande veículo de comunicação, mas esconde isso. Enquanto o minimalista puro quer mostrar que não se entusiasma com nada, e poderia estar morto, sem problemas, o minimalista popular gosta de deixar claro que só lhe importa estar com o "povo", a obra social, etc.
Diante da perda de sentido do mundo, o empolado faz de conta que se importa com algo, a ponto de se dedicar a ele. O minimalista faz de conta que não se importa com nada, e o popular faz de conta que sublimou para o "campo social".

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