quarta-feira, 18 de junho de 2014

Keep calm e fique nervoso

Vejo camisetas "keep calm ... (com vários finais)" andando por aí. Alguns mandam ir pescar, outros mandam se foder. Valesca Popozuda mandou deixar de recalque. Ela fala puxando o final das palavras, de um jeito que no Rio chamamos de "nem", referindo-nos a um estereótipo, mas também a fatos, surgidos no morro e que agora circulam no shopping, na universidade e na tv e internet. E circulam em mim, eu posso falar recalquieeee também. Mas ainda há os que buscam se diferenciar dos "nem". Os ritmos populares trazem o estilo de quem as inventou? Não, o ritmo ajuda a inventar o estilo de ser. O funk faz o garoto dançar enquanto sobe o morro, e dar seus gritos obscenos. E às mulheres puxarem o final das palavras. Muitos que não se acham nem um pouco "nem" compartilham a Popozuda, divertem-se. Mas longe de quererem ser confundidos com a nem. A própria Valesca pode levar na boa o seu Popozuda, deixá-la aparecer diante da plateia, mas de manhã, falar do jeito universitário em uma universidade, e do jeito educada, em uma reunião de produção musical. Ela pode transitar entre os estilos. Agora nós nos achamos educados, mas não temos a liberdade que uma educação boa e literária, que cruzasse por narrativas, permitiria. Ora achamos ridículo, ora gostamos, mas sempre queremos distância do nem. Seríamos nós os recalcados a que a Valesca se refere? Os que gostam da sua bunda e de como ela dança e se veste, e com um pouco de força até admitimos isso para os outros, mas que, por tratarmos isso tudo como exótico, queremos que não se confunda conosco? Podemos pensar uma posição "nem", para a Valesca, com ganhos para nós todos. Diante de alguém que se diz feminista, vou perguntar se algo identificado por machismo não pode ser interessante. E faço o mesmo com quem se diz machista, falando de feminices. Não sou feminista, nem machista. Também não sou de esquerda, nem de direita. Não sou nem uma coisa, nem outra. O que cada caso me diz, e o que cada elemento da cultura pode trazer de bom para mim e para os outros, é a coisa pela qual eu pergunto. Portanto, prefiro uma posição "nem" a uma posição tomada antes de pensar sobre o que acontece.

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