sexta-feira, 13 de junho de 2014

Eu digo não

O que é um eu? É uma instância de reflexão, ou lembrança e pensamento, sobre ideias, necessidades, afetos, objetos e ocorrências tomados como acúmulos do próprio eu. Refletir sobre algo é fazê-lo consciente, passível de ser pensado. A criança ainda não é um eu quando aqueles elementos que listei não são tomados como sendo dela, mas referentes a uma situação de confusão corporal da criança e das coisas do ambiente, como se fossem um só. A consciência formadora do eu requer um certo distanciamento: "eu sinto algo, mas minha mãe não me corresponde. Sentirá ela algo diferente?" Vai se fazendo, aí, um corpo como suporte do eu, ou melhor, das experiências autoreflexivas e oriundas das suas outras atividades. A percepção de que se é diferente do que está em volta, e de que é preciso agir para que eles atendam ao eu próprio, leva a que se diga o "não": "eu não sou assim. eu não quero isso." Age-se, e a ação é positiva, um "sim". Busca-se o que se reconhece que se quer. Então se terá o exito e o fracasso, o que eu consigo e o que eu não consigo. Volta o não, fazendo-me novamente distante, pela consciência, do ambiente. "Como posso vir a conseguí-lo? Com o que posso fazer parceria?" Junho do ano passado foi o eu falando na rua. Disseram que ele estava desorganizado no que queria. Foi a criação de uma distância, vendo a própria vida, na cidade, sem deixar de fazer parte deles. A consciência não requer distância física, nem que o próprio corpo, que vai ganhando consciência de si, deixe de tocar e ser tocado a todo momento. Foi um puro não, um estranhamento, uma crítica. O atual "não vai ter Copa" é isso. Há a instatisfação de sempre, mas deixamos de ser bebês chorosos agarrados à mãe. Sabemo-nos instatisfeitos. A consciência é coisa que incomoda. Essa mãe paternalista não está me atendendo. Ela me oferece um circo, e eu mordo seu seio. Ela me oferece à consciência a imagem de que sempre fui tão alegre... Alguns eus a aceitam, querendo reviver a satisfação pretérita que acham que viveram. Mas há os que dizem "não". Não porque? Pelos motivos de sempre: as prioridades da mãe que não me atendem, e suas companhias que a tornam ainda mais insuficiente para mim. Um motivo novo: já temos a experiência do não. Foi ótimo reparar e falar sobre as coisas. Então dizer não agora será fantástico, pois são são muitas as ações sobre mim, tentando inibir-me de eu ser eu mesmo. Outra mãe de quem me desagarrei é a crítica anterior: os movimentos de esquerda tiveram seu sentido, cada um no seu momento. Não sou misturado a eles, não são minhas as suas experiências, por isso eu quero ver meu mundo, estranhando inclusive o não anterior (o "não" esclarecedor, a crítica que pergunta pela razão das coisas, acaba deixando de criticar, esclarecer a si própria, explica Sloterdijk. E ela gera filhotes que não passaram pelo movimento da crítica, embora achem que sim, ao aceitarem o discurso crítico da mãe como uma explicação do mundo, anterior a que precisem vê-lo). Luta de Classes, e suas crias (alienação e ideologia) não dão mais conta. E não aceito o sim também já dado, a festa de presente, pois eu não me vejo como um bom anfitrião, nesse momento. Estou no "não à Copa", meu corpo não vai pular. O eu está no não, não, não, para logo aparecer com o que ele quer.

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